Sentadas num daqueles sofás rígidos que se encontram em qualquer quarto de banho de centro comercial, eu e ela chorámos. Ela por ela. Eu por ela. Chorámos.
Ao nosso lado duas teens disfarçam-se de Paris Hilton em frente a um espelho enorme. Pessoas entram e saem. E nós ali, choramos.
Senti-me como um daqueles cowboys dos filmes que víamos em pequeninos, a olhar para o cavalo ferido, sabendo que o tem de abater. Não há opção possível. Entre vê-lo sofrer lentamente e matá-lo com uma bala na cabeça, cowboy que os tenha no sítio saca da arma e dispara. Assim me senti eu. E como quero crer que também os tenho no sítio, disparei: “Ele gosta de ti… só não quer ficar contigo”. Ou seja… ele não gosta assim tanto de ti. “E sabes que mais? (continuei) Provavelmente vai mesmo acabar por comer a tipa”. Dizer isto a uma das nossas pessoas preferidas é como perder o tal cavalo.
Depois de um almoço de gargalhadas, vê-lo a passar com outra foi como beber um copo de água gelado em momento de sensibilidade dentária. A dor. O arrepio. As lágrimas que nos chegam aos olhos. Levantámo-nos da mesa deixando o café a meio. De repente o Domingo de sol transformou-se numa 2.º feira chuvosa.
O ser humano é um bicho estranho. Ama, odeia, gosta mas não quer ficar. Todos nós já estimemos nesta situação de ser gostados (mas não “ficados”), bem como do lado oposto, de quem não gosta o suficiente. É que uma coisa é nutrir sentimentos por alguém, pensar na pessoa, e alimentar uma espécie de “consciência amorosa”, que englobe cafés aos domingos à tarde, idas ao cinema e telefonemas a altas horas da noite em busca de companhia. Coisa diferente é imaginarmo-nos com a criatura todos os dias do resto das nossas vidas, acordar com ela e adormecer com ela, partilhar desde os pensamentos mais íntimos até à escova de dentes. Esta última opção está reservada a uns quantos eleitos, não ao comum mortal.
O mesmo sucede com os gelados e eu. Gosto o suficiente para comer um dia sim dia não. Lambuzo-me com eles, lambo os dedos para saborear o que derreteu, desejo-os quando os não tenho. Mas não o suficiente para comprar uma geladeira, que me permitiria fazer os meus próprios gelados todos os dias e quase me alimentar disso. Gostava de apresentar uma comparação mais inteligente, com laivos filosóficos, mas esta foi a analogia que me veio à cabeça. …As lágrimas continuavam a correr-lhe pela cara quanto me abracei aos joelhos dela. De repente diz-me: “Quero ir para casa, leva-me a casa. Preciso dormir”. Levantei-me. Meti a arma no coldre. Puxei o meu chapéu. Afinal, o cavalo não estava morto, só precisava de fechar os olhos.
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"só precisava de fechar os olhos"... para depois os abrir e neles se ver reflectida a luz. :)
ResponderEliminarmonica
A luz não sei se viu Mónica (acho que ainda não.. há que dar tempo), mas viu-me a mim, que sou uma espécie de luz florescente (recordemos as aulas de latim: luz, lucce, Lúcia).
ResponderEliminarRaras vezes me acontece, mas consegui ficar sem palavras após ler este texto. Transmite uma enorme riqueza em essência e sentimento.
ResponderEliminarQuanto "ao cavalo", ainda bem que não "o" abateste. Ainda iremos vê-l"o" relinchar por aí, na certeza de que a força interior que possui, aliada ao apoio de pessoas como tu, Cat, irá ultrapassar esta e todas as outras alturas de sofrimento.