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É incrível como as pessoas que julgamos mais sensatas e responsáveis abrem a boca para dizer que nos amam com a maior leviandade. Como se nos tivessem dito “fecha a porta” ou “está frio hoje”. Como se nada. Não sei se esperam que no dia seguinte nos tenhamos esquecido disso. Ou no ano seguinte. Ou na década seguinte.
Ainda hoje fico perplexa com a leveza com que se usam certas palavras. Não me refiro à mentira propriamente dita. Quero acreditar que as coisas bonitas que me têm dito ao longo destes anos não eram mentira, pelo menos que não o eram naquele momento. Que quem as disse acreditava piamente estar a ser sincero. Mas duvido que fosse aquele realmente o sentimento que lhes ia na alma. Um pouco como quando eu prometi à minha mãe que não faria mais nenhuma tatuagem: não menti descaradamente, não a tencionava enganar, mas uma parte de mim não estava bem certa de conseguir cumprir. Resultado: mais um dragão na perna.
A afirmação - sempre forte e assertiva – de que se ama alguém é uma das que mais leviana se tornou e, por isso mesmo, mais vazia. É que amar não é o mesmo que gostar. Eu gosto de gelados e de bolas de Berlim. Não os amo porém. Não seria capaz de partilhar a minha vida com um corneto, muito menos de dar a vida por uma taça de creme de pasteleiro. Desconfio que a confusão entre gostar e amar se deva ao “I love you” que povoa a nossa linguagem desde que vimos na televisão o primeiro filme de Hollywood. A partir daí “lovamos” tudo, desde os nossos jeans preferidos até à Coca-Cola, passando por pais, amigos e namorados. Acontece que na língua portuguesa o amor é um sentimento que vai para além da preferência, do gosto ou mesmo da paixão.
Como trabalho com palavras tenho o maior dos cuidados no momento de as utilizar. São a minha arma, o modo como enfrento o mundo. Há quem cante (já aqui confessei ter sido eleita a pior cantora do planeta), quem desenhe (eu fico-me por uns rabiscos nas margens das folhas), quem corra (restrinjo essa hipótese à necessidade de chegar a tempo a uma loja prestes a fechar), quem dance (aqui faço o gosto ao pé… e ao rabo…. a bem dizer, a tudo), quem cozinhe (digamos que nunca conquistarei um homem pelo estômago). Pois bem, eu escrevo e falo. Estejam certos que quando utilizo uma palavra nunca o faço por acaso ou de forma irreflectida. Por isso me custa tanto compreender que se delas se faça um mau uso. Dizer que amamos alguém que conhecemos na semana passada é o mesmo que usar sapatilhas com o vestido preto cintado. Não conjuga. Posso até acreditar em amor à primeira vista, mas não é à segunda vista que se sabe que se ama. Apenas passadas muitas vistas nos apercebemos disso e eventualmente até concluímos que tudo sucedeu logo na primeira. Mas essa resposta chega bem mais tarde.
Tão-pouco funciona dizer em voz alta “amo-te” para nos persuadirmos disso. É que se pode querer com todos as células do corpo amar alguém, mas se o coração não bombeia para esse alto de pouco serve gritá-lo em voz bem alta. Só vamos conseguir fazer ruído. E, pior do que isso, não nos convenceremos a nós, mas convenceremos o outro de que assim é.
Por isso não digam nada. Remetam-se ao silêncio. Vão gostando. Vão estando. Vão curtindo a pessoa. Mas se um dia a amarem, aí, digam-no. Porque o pior que pode acontecer é ela nunca vir a saber disso.
Sempre fui a boy’s girl. Não Maria-rapaz, note-se. Enfim, admito que na minha infância e nos primórdios da adolescência cheguei a ser confundida com um rapazinho. O cabelo curtinho não ajudava (obrigada mãe!), mas a certa altura transformei-me numa Barbie. E digo isto sem vergonha. Vivo na futilidade dos trapos, dos batons e dessas coisas todas que fazem os homens vomitar. Ainda assim – e isto é que é verdadeiramente surpreendente – sempre fui uma menina de meninos. Mais amigos que amigas. E bem mais próximos. A minha melhor amiga foi, e é, um menino, e com isto penso que digo tudo. Não meninos que me acompanham na secreta esperança de tirar uma lasquinha, de algum hipotética romance ou, que mais não seja, umas voltinhas de quando em quando. Nada disso. Falo de meninos que me vêm algures entre “um gajo sem pilinha que vai connosco para todo o lado” e a “irmã mais nova que há que respeitar”.
Nestes termos tenho visto intermináveis jogos de futebol (estou um autêntico Rui Santos… até pelos caracóis…), feito de motorista com o carro cheio de marmanjos bêbados (sendo que todos sabem que no meu carro ninguém vomita), chorado baba e ranho nos seus ombros (e nunca esquecerei aquelas palavras de consolo, que oscilam entre o kitsch/lamechas e o absolutamente destrutivo).
Esta é, provavelmente, a primeira altura da minha vida em que começo a acompanhar mais com mulheres. Até à data a ideia em si mesma dava-me alergia. Não me que falte assunto. Desde logo, sempre posso falar de sapatos, e temos conversa para uma semana. Não que me sinta ameaçada, ou elas por mim. Aliás, se há coisa que aprendi nestes últimos meses é que a tão falada rivalidade feminina é um mito urbano. Não nego a sua existência (yo no creo en bruxas, pero…), mas até aqui só me deparei com mulheres fantásticas que serão sempre, nas suas particularidades, “role models” para mim.
Mas a verdade é que nada disto me faz esquecer os meninos. E por isso mantenho o hábito de passar tempo sozinha com eles. E cada vez que isso sucede fico destroçada pela angústia de nunca me ter apaixonada por nenhum… nem eles por mim. Porque os meus meninos são os melhores homens do planeta. Admito que alguns deles encaixam no protótipo do “filho da puta”, que nem todos foram sempre correctos e gentis para com as mulheres do mundo. Mas em todos eles descubro pedacinhos da minha meia laranja. Será que os posso cortar e cozer, construindo um home-made namorado? Se o Dr. Frankenstein o fez, porque não eu? Será que tenho procurado nos amigos aquilo que não encontro nos outros homens? Mas, nesse caso, porque motivo então nunca houve click com nenhum deles?
Já me chegaram a dizer que a minha excessiva proximidade masculina me prejudica mais do que me beneficia. Porque conheço demasiado os homens (o que nunca impediu que caísse como as outras). Porque coloco a fasquia ao elevadíssimo nível dos meus melhore amigos, que são uns fora de série, e como a maior parte dos homens fica muito aquém desse limiar acabo por ter expectativas demasiado altas que depois saem goradas. Porque estar sempre acompanhada com meninos funciona como repelente para o restante público masculino.
Provavelmente tudo isto é verdade. Pelo menos, dava-me jeito que fosse, e com isso encontrava já uma explicação para muita coisa. Ainda assim, e embora aprecie uma tarde de compras com as amigas, nada bate as noites no meio deles, muitas vezes com a minha integridade física em risco, nas mãos de alguma nina mais ciumenta.